Contra o desemprego
Os estrategistas inimigos dos trabalhadores pensam poder dividir o movimento sindical brasileiro, afastar suas direções da base e, se for possível, separar o movimento da dinâmica da sociedade tornando-o irrelevante.
É o que conseguiram fazer nos Estados Unidos, desde a administração Reagan, obtendo lá a quase total dissociação entre a cúpula sindical e a base dos trabalhadores em suas orientações e escolhas.
Aqui no Brasil, no entanto, são muitas as dificuldades no caminho do isolamento social do sindicalismo.
A primeira delas e a mais importante é a experiência integradora do movimento sindical. Uma das singularidades da derrota da ditadura militar foi, exatamente, o casamento entre a pauta sindical e a pauta democrática da sociedade, criando uma dinâmica tal que a Constituição de 1988 consagrou direitos trabalhistas e sindicais importantes, apesar da correlação de forças políticas entre os constituintes e das incompreensões.
Outro exemplo é a política de valorização real do salário mínimo (interrompida pela primeira vez este ano) que se impôs apesar das adversidades e antagonismos e que revelou-se altamente favorável aos trabalhadores. Deve-se notar que a adoção dessa política decorrente da firme e unitária posição das centrais beneficiou basicamente os milhões de trabalhadores e aposentados que não formam, em última análise, a base do movimento sindical e das centrais, já que esta tem como parâmetro salarial mínimo os pisos profissionais constitucionais negociados.
Na atualidade, com forte recessão, um novo exemplo e uma nova possibilidade de integração social apresenta-se para o movimento na luta contra o desemprego.
Para meu uso, afirmo que o contingente de desempregados (torturadas as estatísticas) deve equivaler ao número de trabalhadores sindicalizados; são dois conjuntos que não têm quase nenhuma intercessão. No entanto, o empenho do movimento sindical para enfrentar os problemas dos milhões de trabalhadores desempregados é um poderoso exemplo de integração social e cidadania.
Para tal objetivo, uma iniciativa importante foi a reunião, a convite do presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, Miguel Torres, e do presidente estadual da Força Sindical, Danilo Pereira, de duas dezenas de entidades sindicais fortes com base paulistana e a representação de quatro centrais sindicais, quando criaram a Frente Contra o Desemprego.
Além do eixo estratégico da luta produtivista contra os juros altos e pela retomada do desenvolvimento, os dirigentes sindicais discutiram uma pauta relevante destinada a enfrentar o desemprego em São Paulo, com medidas pontuais a serem discutidas com as administrações municipal e estadual, bem como o esforço necessário para integrar os trabalhadores desempregados (principalmente os jovens) e incorporá-los à luta comum.
Uma próxima reunião da Frente está convocada para o dia 26, no Sindicato dos Eletricitários.
João Guilherme Vargas Netto é analista político e consultor sindical
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Ainda uma vez, os quatro eixos
Agora que se restabeleceu minimamente o empenho unitário entre as centrais sindicais e as confederações e com a adoção de um cronograma de reuniões, manifestações e seminários com a ajuda do Dieese e do Diap, é bom que se sistematize o conjunto das tarefas que são desafios para os trabalhadores, para as entidades e para todo o movimento sindical.
O fundo do quadro continua o mesmo: grave recessão, desemprego crescente e queda dos salários (pela primeira vez em mais de 15 anos o salário mínimo não teve aumento real), bem como a predominância social de uma agenda regressiva.
Os quatro eixos em que se pode organizar a ação necessária, conjugando com inteligência a capacidade de mobilização na base e a habilidade na negociação no Congresso Nacional e na vida das empresas, são os seguintes:
1- Eixo da resistência – sob a palavra de ordem de “nenhum direito a menos” a resistência se dá contra a reforma da previdência pública proposta pelo governo, nas discussões da pretendida “reforma trabalhista” (sem urgência) e no esforço no Congresso contra a terceirização generalizada.
2- Eixo produtivista – para o movimento sindical interessa muito o enfrentamento e superação do quadro recessivo, bem como a adoção de políticas públicas de desenvolvimento. Temas importantes neste eixo são: a luta contra os juros altos, a melhoria do sistema de crédito, a adoção de políticas pontuais como a renovação da frota e o esforço para a retomada dos investimentos com valorização dos projetos e obras de engenharia nacional. O eixo produtivista possibilita alianças entre mundo do trabalho e o empresariado.
3- Eixo das campanhas salariais – levando-se em conta os efeitos funestos da recessão sobre os resultados das últimas campanhas e a suspensão monocrática da ultratividade, é preciso organizar com mais eficiência as próximas campanhas salariais que se prolongam ao longo do ano, coordenando-se ao máximo o empenho de luta, de mobilização e de negociação das diferentes categorias.
4- Eixo do interesse individual e imediato dos trabalhadores – aqui comparecem aquelas questões emergenciais que dizem respeito a milhões de trabalhadores, sindicalizados ou não, embora seu efeito seja relativamente pequeno em cada caso individual. Exemplos fortes: a luta pela correção da tabela do IR, a vigilância sobre o correto pagamento do 13º salário e de outros benefícios e a ajuda sindical ao acesso dos trabalhadores às contas inativas do FGTS.
João Guilherme Vargas Netto é analista político e consultor sindical
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Previdência: perversidades na regra de transição
As regras de transição nas reformas previdenciárias, tanto no Brasil quanto no exterior, costumam ser generosas, com longos períodos para respeitar o direito “acumulado” e não frustrar completamente a expectativa de direito. Foi assim na reforma de FHC e, via PEC paralela, na do Lula.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/16, do governo Temer, ao contrário da tradição, restringe drasticamente as possibilidades de transição, especialmente para os segurados do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), que congrega os trabalhadores da iniciativa privada, contratados pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e filiados ao Instituto Nacional de Seguro Social (INSS).
O segurado do INSS que, na data da promulgação da Proposta de Emenda à Constituição, ainda for não aposentado ou ainda não tiver preenchido os requisitos para requerer o benefício, será incluído nas novas regras e não será beneficiado pelas regras de transição, exceto se tiver idade igual ou superior a 45 anos, no caso da mulher, e 50, no caso do homem.
O “felizardo” que for “beneficiado” pelas regras de transição poderá se aposentar antes dos 65 de idade, o novo requisito, porém terá que pagar um “pedágio” de 50% sobre o tempo que faltar nessa data para completar os 30 anos de contribuição, se mulher, ou os 35, se homem.
Esse segurado, entretanto, será “beneficiado” apenas em relação ao requisito da idade, ou seja, não será exigida dele a idade mínima de 65 anos, mas sua aposentadoria será calculada com base nas novas regras, quais sejam: 51% da média dos salários de contribuição, acrescida de 1% por cada ano de contribuição.
Assim, mesmo que o segurado faça parte da transição (tenha idade igual ou superior a 45m/50h), não valem mais as regras de cálculo anteriores (fórmula 85/95, o fator previdenciário, a média das maiores contribuições etc.). Estas só permanecem para o segurado que, mesmo já tendo condições de requerer o benefício na data da promulgação da emenda, ainda não o fez, sendo preservado pelo direito adquirido.
Além disto, as novas regras de cálculo, diferentemente do atual, que somente considera 80% dos maiores salários de contribuição, passará a levar em conta todas as contribuições feitas ao longo da vida laboral, a partir de julho de 1994, rebaixando ainda mais a média.
Portanto, se a reforma passar nos termos propostos, o valor de todas as aposentadorias pelo regime geral (INSS), a partir da promulgação da emenda, será calculado com base em 51% das médias de contribuições, acrescida de 1% por ano de contribuição, exceto apenas para quem já tenha direito adquirido.
Não bastasse tudo isso, a PEC elimina a aposentadoria por tempo de contribuição e institui uma nova aposentadoria por idade, com exigência superior à regra atual, penalizando duramente as mulheres, além de ampliar o tempo de contribuição mínimo exigido de 15 para 25 anos, num verdadeiro retrocesso social. A nova regra alcança, inclusive, os atuais segurados que não tenham sido protegidos pela regra de transição.
O valor da aposentadoria do segurado do INSS, portanto, poderá variar entre 76% da média das contribuições, no caso de quem requerer o benefício após 25 anos de contribuição, e 100% da média, desde que o segurado comprove 49 anos de contribuição. Sem esses dois critérios, os futuros segurados não poderão se aposentar, exceto no caso de invalidez ou de aposentadoria por atividade insalubre, quando a redução poderá ser de até 10 anos na idade e cinco no tempo de contribuição. Em qualquer hipótese, há ampliação dos requisitos e redução do valor do benefício em relação às regras atuais.
No caso dos servidores públicos, a transição é um pouco menos perversa, mas também é prejudicial. O servidor com mais de 50 anos de idade e a servidores com mais de 45 podem ser incluídos na regra de transição, tanto em relação à nova idade quanto em relação ao cálculo do benefício, desde: 1) que tenha ingressado no serviço público antes de 2004, 2) comprove 20 anos de serviço público no momento da aposentadoria, 3) pague um pedágio de 50% sobre o tempo que faltava para aposentadoria no momento da promulgação da reforma, e 4) contem com 30 anos de contribuição, se mulher, ou 35, se homem.
Todos os demais, atuais e futuros, serão submetidos às novas regras, inclusive quanto a cálculo do benefício, nos exatos termos dos segurados do INSS. Em qualquer hipótese, como se vê, há ampliação dos requisitos e redução do valor do benefício em relação às regras atuais.
Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista político, diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap)
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Planos limitados de internet: discriminação e injustiça social
Desde 2015, empresas que concentram o serviço de conexão à internet em banda larga fixa – Vivo, Claro e Oi detêm mais de 83% do mercado – vêm indicando que pretendem acabar com o acesso ilimitado.
As operadoras pretendem aplicar o mesmo sistema dos planos de internet pela rede móvel, ou seja, se o consumidor utilizar o volume de dados contratado antes do fim do mês, ou bloqueiam o acesso a internet (que só volta a ser ativado se o usuário pagar mais) ou restringem o acesso a determinados aplicativos fornecidos por outras empresas escolhidas de acordo com seus interesses comerciais. Em geral, o acesso se restringe ao Facebook e ao WhatsApp.
As duas práticas são ilegais de acordo com o Marco Civil da Internet. O bloqueio do acesso após encerrado o limite de dados ou franquia é ilegal, pois a lei, coerente com o reconhecimento do caráter essencial da conexão a internet para o exercício da cidadania, determinou que o corte só pode ocorrer se o consumidor não pagar a conta. O Código do Consumidor diz o mesmo: se o serviço é essencial, deve ser prestado de forma contínua.
A prática de restringir o acesso a certas aplicações também é ilegal. Isso porque a empresa estará privilegiando determinados dados, o que representa desrespeito à neutralidade da rede.
A neutralidade é princípio fundamental para garantia de democracia na internet. Sem ela, acordos comerciais ou forças políticas poderiam restringir o tráfego nas redes, comprometendo direitos fundamentais como o direito à comunicação e a liberdade de expressão.
Ou seja, a franquia, do modo como vem sendo comercializada, representa acesso limitado não só a internet, mas aos direitos conquistados com o objetivo de promover a inclusão digital e a diminuição do fosso social.
Aceitar os planos com franquia implica que os cidadãos mais pobres, sem renda para contratar planos ilimitados caros, tenham acesso restrito a internet, sem poder fazer cursos on-line, participar de consultas públicas, assistir sessões dos Tribunais, baixar documentos, assistir filmes, utilizar a rede para atividades comerciais ou outras essenciais para seu desenvolvimento econômico, social e cultural.
Dados recentes da pesquisa do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), órgão ligado ao Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), mostram que 65% dos cidadãos das classes D e E e 45% da classe C só acessam a internet pela rede móvel, enquanto 84% da classe A acessa tanto pela rede fixa quanto pela móvel, revelando que a adoção do modelo de franquia vai comprometer a inclusão digital, que só se alcança plenamente pelo acesso fixo e ilimitado.
Hoje, os planos de franquia na rede fixa estão suspensos por decisão da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que também instalou consulta pública sobre o tema, cujo prazo se encerra em 30 de abril.
Entretanto, na semana passada, o ministro da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações, Gilberto Kassab, que anda muito afinado com o presidente da Anatel, Juarez Quadros, antecipou publicamente que, em breve, as franquias estarão autorizadas.
Aliás, não foi surpresa, pois a Anatel tem dito em diversas manifestações públicas que é favorável à limitação, alegando, assim como fez o ministro, que esta seria uma medida benéfica para o consumidor.
O CGI.br já afirmou que qualquer decisão a respeito da franquia deve ser embasada por estudos técnicos, jurídicos e econômicos e recomendou que a Anatel, a Secretaria Nacional de Defesa do Consumidor, o Conselho de Administração Econômica, associações de usuários e empresas, provedores de acesso e operadoras de telecomunicações devem buscar juntos soluções que atendam o desenvolvimento democrático da internet.
Mas a Anatel e o MCTIC não têm compromisso com a governança multiparticipativa da internet, como determina a lei, e Kassab está ansioso para mostrar que privilegia os interesses privados de grupos econômicos multinacionais poderosos.
Flávia Lefévre é advogada da Proteste, associação de Consumidores e representante do 3º setor no Comitê Gestor da Internet. Artigo publicado, originalmente, no jornal Brasil de Fato, no dia 17 de janeiro de 2017.
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Decisão do TST beneficia dentistas de todo o País
É da natureza do trabalho do dentista o contato com agentes prejudiciais a saúde. Por isso, cirurgiões dentistas têm direito a receber adicionais por insalubridade e periculosidade. São benefícios distintos, identificados em situações diferentes. Até poucos dias profissionais submetidos as duas condições tinham que optar pelo recebimento de um dos adicionais. Uma decisão do Tribunal Superior do Trabalho mudou isso, beneficiando milhares de dentistas em todo o Brasil.
A decisão do TST confirmou, em caráter terminativo, que o cirurgião dentista que trabalha em contato com agentes insalubres e periculosos, tem direito de receber pelos dois adicionais, não tendo mais que optar apenas por um deles, conforme regia antigo entendimento da CLT.
Na prática, significa que esses profissionais têm direito a receber mensalmente 40% sobre o salário mínimo relativo ao adicional de insalubridade e mais um adicional de 30% calculado sobre o seu vencimento, relativo a periculosidade. É importante alertar: para ter direito de receber os dois adicionais o profissional precisa comprovar que está submetido a tais condições no ambiente de trabalho.
Para ter direito a receber os adicionais o profissional tem que trabalhar sob condições que configuram insalubridade e periculorisade. Podemos citar alguns agentes insalubres em grau máximo que os cirurgiões dentistas costumam ter contato: agentes biológicos, através do contato com secreções orais, como a saliva, o sangue e eventualmente secreções purulentas dos pacientes, agentes químicos, em especial o contato com alguns elementos considerados nocivos a saúde e utilizados nas restaurações e esterilizações. Entre eles destaca-se o amálgama (mercúrio e a limalha de prata com teor de cobre, estanho , zinco e formaldeídos). Quanto aos agentes periculosos, citamos aqueles emanados pelo aparelho de raio x, muito utilizado pelos cirurgiões dentistas que, com frequência, são expostos a radiação ionizante ou a substância radioativa desses aparelhos.
Com a decisão do TST é possível ao profissional que exerceu as atividades nas condições insalubres e periculosas, obter na justiça o direito de receber ambos os adicionais e seus reflexos em todas as demais verbas salariais (horas extras, Descanso Semanal Remunerado, férias + 1/3 e FGTS) referente aos últimos cinco anos. Procure um advogado de sua confiança, especializado em Direito do Trabalho e exerça seus direitos.
Carolina Centeno de Souza é sócia no Arraes & Centeno Advogados Associados e advogada especialista em direito do trabalho e previdenciário
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