A PEC 241 e o papel do Estado brasileiro
O governo interino de Michel Temer encaminhou ao Congresso uma Proposta de Emenda à Constituição – PEC 241/16, que, se aprovada, terá o condão de alterar o papel do Estado brasileiro. Ela determina que a expansão do gasto público não-financeiro nos próximos 20 anos não poderá ser superior à inflação.
Pouco se falou da gravidade dessa iniciativa, que terá consequências catastróficas sobre o futuro do País e do povo brasileiro. Apontamos a seguir algumas dessas possíveis consequências para ilustrar a gravidade dessa proposta, que atende integralmente aos interesses do mercado financeiro.
A primeira consequência será a limitação ou o direcionamento do papel do Estado apenas para garantir o direito de propriedade, assegurar o cumprimento de acordos e honrar os compromissos com os credores das dívidas interna e externa, já que não poderá mais criar novos programas nem ampliar investimentos.
A segunda será a retirada do controle do Poder Executivo, do Congresso e da sociedade sobre o tamanho do orçamento, que ficará automaticamente engessado por 20 anos, independentemente de haver crescimento econômico ou aumento de arrecadação.
A terceira será o acirramento do conflito distributivo, com os diversos setores da sociedade lutando para ver quem perde menos com os cortes, considerando que a prioridade é economizar nas despesas de custeio e investimento para assegurar o pagamento dos encargos da dívida mobiliária.
A quarta será o desmonte do Estado enquanto instrumento de prestação se serviços, com uma forte reforma administrativa voltada à desvalorização dos servidores, com corte de direitos e de reajustes, além da proibição de novas contratações, mediante a vedação de novos concursos públicos nos próximos 20 anos.
A quinta será a inevitabilidade de uma reforma ou ajuste com viés fiscal na seguridade social e na educação, já que o congelamento não se sustenta sem um drástico corte de despesas na previdência e assistência social, na saúde e na educação.
Apenas a título de ilustração, se as regras da PEC 241 já estivessem em vigor desde 2003, início do primeiro mandato do presidente Lula, o salário mínimo, atualmente de R$ 880,00 seria equivalente a R$ 509,00. O gasto com saúde e educação seria a metade do que é hoje.
No caso da previdência e da assistência social, o maior programa de distribuição de renda do planeta, que é responsável pela paz social no Brasil, seu escopo teria sido reduzido drasticamente, não apenas para dificultar o acesso a esses benefícios, mas também para desvincular suas prestações do salário mínimo, especialmente os benefícios assistenciais, cujo valor seria próximo do pago aos beneficiários do Bolsa-Família.
Pode parecer terrorismo, mas a verdade é que o congelamento do gasto público obriga o corte de direitos dos atuais beneficiários para permitir o acesso a esses direitos de novas pessoas, afinal a população não para de crescer, as pessoas preenchem os requisitos para requerer aposentadoria, há demanda por mais saúde e educação e isso só será possível se houver aumento da despesa ou redução dos benefícios de quem já vinha usufruindo desses benefícios.
O raciocínio é simples. Se há um valor fixo, que já está comprometido com uma despesa, o atendimento a novos beneficiários só será possível se o valor que atende aos atuais for reduzido. Na previdência, por exemplo, existe uma regra de reajuste que só continuará a ser aplicada se não houver nenhuma nova aposentadoria. Como novas aposentadorias surgirão, ou se aumenta o valor (o que a PEC proíbe) ou se suprime o reajuste. A última hipótese, combinada com o corte de direitos, é que será colocada em prática, segundo a visão do governo.
O governo fez uma opção política de não aumentar tributo dos mais ricos e economizar em cima dos mais pobres. Com a PEC 241, a prioridade é o pagamento da dívida, já que essa não está sujeita a nenhum tipo de congelamento. É simples assim.
Antonio Augusto de Queiroz é diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap)
A luta que precisa ser travada
A sociedade vê-se diante de graves ameaças, que incluem a reforma da Previdência Social e a precarização das relações do trabalho. O movimento sindical deve atuar unido contra essa pauta regressiva e injusta.
Direitos sociais em tempos de crise
Nenhum modelo de crescimento pode abandonar os alicerces de um mercado de trabalho civilizado e justo para todos ou apontar para o enfraquecimento da Justiça do Trabalho, sendo relevante lembrar que propostas de reforma devem observar a Constituição Federal, que prevê a construção progressiva de novos direitos no intuito de melhorar a condição social do trabalhador e não de reduzir as suas conquistas históricas e fundamentais.
Oito ou oitenta
Em reuniões sindicais muitas vezes ocorre que uma discussão sobre um tema específico suscite o aparecimento de vários temas correlatos e, com o andar da carruagem e o ardor dos participantes, o que era um problema a ser enfrentado e resolvido transforma-se, com todos os seus desdobramentos, em uma tarefa insolúvel.
Ao querer resolver tudo, capitula-se na resolução do possível gerando uma sensação de impotência; é a derrota por excesso de ardor diversionista.
Uma variante desta patologia é o ataque ao “bei de Túnis”, tão praticado por Eça de Queiroz. Quando, como jornalista, ele não tinha assunto, atacava o potentado estrangeiro como origem inalcançável de todos os males e problemas. O bei, hoje, pode ser qualquer um, a gosto do atacante, mas o ataque não resolve nada.
Há um antigo apólogo grego que retrata muito bem esta situação e sua disjuntiva.
Um filósofo grego argumentava para outro:
– “Podes levantar nos braços, facilmente, um ganso. Se podes levantar um ganso poderás levantar uma ovelha. Se levantas uma ovelha, nada impede que também levantes um bezerro. E, se fazes isto, o que impede que levantes um touro?
Mas ninguém acreditaria que podes levantar em teus braços o Partenon. Nem tu mesmo, por Hércules!”
Na grande maioria das situações o método gradualista, com etapas bem definidas e passíveis de ser enfrentadas com êxito, é bem melhor que os arroubos maximalistas irrealizáveis. Até mesmo porque, quase nunca, o oito ou oitenta é uma boa aposta.
João Guilherme Vargas Netto é analista político e consultor sindical
Previdência: o que seria o limite de idade nas aposentadorias
Sobre a igualização para homens e mulheres e para trabalhadores urbanos e rurais, repito muitas vezes: isonomia significa igualdade para os iguais, não para os desiguais. Quando comprovadamente as condições de trabalho forem absolutamente as mesmas para homens e mulheres, trabalhadores urbanos e rurais, haverá o reflexo no Seguro Social; até lá…