Unesco prepara base de dados sobre pesquisas de inovação
Órgão da ONU iniciará coleta de dados de cerca de cem países em agosto e deve lançar em 2014 o relatório com os resultados. Projeto-piloto da coleta global, reunindo informações de 12 paí
A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) vai iniciar em agosto um estudo sobre pesquisas de inovação em cerca de cem países para montar uma base de dados mundial que poderá balizar o aprimoramento de políticas públicas para o setor. O projeto está sendo realizado pelo Instituto de Estatísticas da Unesco (UIS, na sigla em inglês), com sede no Canadá, e as conclusões deverão ser divulgadas no segundo semestre de 2014. Um relatório sobre o projeto-piloto dessa coleta global, reunindo informações de 12 países, incluindo o Brasil, mostrou como as diferenças de metodologias e níveis de desenvolvimento podem representar um desafio para a realização desse tipo de esforço estatístico.
Projeto-piloto da coleta global, reunindo informações de 12 países, incluiu o Brasil Com base nesses resultados, a UIS decidiu limitar o escopo do levantamento mundial somente à indústria de transformação, excluindo outras atividades econômicas como serviços, agricultura e mineração. Após o projeto-piloto, cujos resultados foram divulgados em 2012, a UIS produziu outro estudo para auxiliar na coleta de dados que se inicia no próximo mês. Essa coleta de metadados de inovação gerou um relatório, divulgado no mês passado, com estatísticas de 26 países, a maioria não vinculada à Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Demanda por estatísticas
Atualmente não existe uma base de dados global com indicadores sobre inovação. Apenas a União Europeia (UE) dispõe de um repositório similar na Eurostat (agência de estatísticas da Europa), feito a partir da Community Innovation Survey (CIS) - série de inquéritos estatísticos que permite aos cerca de 30 países do bloco compararem seus resultados. "Há uma demanda grande por estatísticas de inovação, mas ainda não existe essa base de dados. Nossa meta é criá-la e torná-la disponível para o público em geral", afirma Luciana Marins, economista brasileira que trabalha desde 2010 como pesquisadora do UIS, em entrevista por telefone, de Montreal, para Inovação Unicamp.
"Há uma demanda grande por estatísticas de inovação, mas ainda não existe essa base de dados" A meta principal da UIS é organizar a coleta de dados secundários, ou seja, reunir os dados agregados já obtidos pelos países sobre a inovação em seus territórios. "A maior parte das pesquisas nacionais de inovação é guiada pelo Manual de Oslo, que é um manual da OCDE para coletar e interpretar dados sobre inovação. Na América Latina há o Manual de Bogotá, mas nem todos os países o utilizam. Às vezes, seguem só o de Oslo, às vezes, misturam os dois e, em poucos casos, seguem só o de Bogotá", explica a pesquisadora.
Inventário de pesquisas
A coleta global vai buscar informações de ao menos 95 países que promovem pesquisas de inovação. Inicialmente foi feito um inventário das nações que realizam esses estudos e quantas rodadas já foram feitas em cada local. No Brasil, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) está concluindo neste ano a quinta rodada da Pesquisa de Inovação (Pintec), referente ao ano de 2011. O trabalho consistiu também em documentar as perguntas sobre inovação apresentadas pelos organizadores locais e identificar as mais comuns. Um dos maiores desafios é reunir resultados obtidos a partir de metodologias distintas, mesmo que baseadas em manuais internacionais. "Só pudemos utilizar dados de indústrias de transformação, pois serviços e outras áreas não eram uniformes entre os países. Muitas vezes os serviços incluídos na pesquisa do Brasil, por exemplo, não estão incluídos na pesquisa da Malásia."
Opções metodológicas
Também há diferenças em cada caso no momento de mensuração das empresas; a classificação de tamanho das firmas nem sempre é com base no volume de funcionários, mas sim no volume de vendas. A coleta de metadados serviu para identificar essas diferenças metodológicas e também como uma parte inicial da coleta global que se inicia em agosto. O relatório de metadados, que tem a função exclusiva de relatar as diversas pesquisas nacionais sem analisar, entretanto, esses resultados, foi divulgado no site na UIS na última semana de junho. "Infelizmente, no estágio atual, não existe uniformidade entre todas as pesquisas de inovação, porque estamos comparando países de diferentes regiões, com diferentes estágios de desenvolvimento."
Estudo concluiu que a inovação está presente em todos os países, independentemente do grau de desenvolvimento Segundo a economista, uma das discussões em aberto sobre as pesquisas nacionais se refere ao levantamento conjunto ou separado de dados de inovação e de pesquisa e desenvolvimento (P&D). No Brasil, por exemplo, a Pintec reúne informações dos dois temas no mesmo questionário, mas há países que separam essas pesquisas. "Há vantagens e desvantagens. A reunião de dois tópicos em um só questionário permite mais espaço para correlacionar as duas variáveis em uma mesma amostra; além do mais, incomoda-se menos as empresas com um questionário único, o que pode melhorar a adesão", enumera Marins.
No entanto, entre os pontos negativos estão: a necessidade de se elaborar um questionário demasiadamente longo e abrangente e a possibilidade de o representante da empresa que fornece as respostas ter mais afinidade com inovação do que com P&D, ou vice-versa. Normalmente as pesquisas sobre P&D costumam realizar um levantamento censitário do país, englobando todas as empresas que realizam a atividade. Já as pesquisas de inovação costumam optar por amostragens que possam representar uma parte significativa do universo de firmas que desenvolvem atividades de inovação.
Além de organizar os dados nacionais, o UIS também oferece treinamento para países ou regiões que queiram conduzir pela primeira vez pesquisas de inovação, o que permite compreender melhor as vantagens da adoção do Manual de Oslo, que, apesar de ter pontos a serem melhorados, ainda é a melhor opção para se definir metodologias, segundo Marins.
Piloto
No projeto-piloto da coleta global, divulgado em 2012, a UIS selecionou 19 países de diferentes regiões e enviou questionários para que os responsáveis pela execução das pesquisas nacionais pudessem respondê-los com base nos dados da última rodada. No entanto, apenas 12 países enviaram respostas: África do Sul, Brasil, China, Colômbia, Egito, Gana, Indonésia, Israel, Malásia, Filipinas, Rússia e Uruguai. Foram consideradas as inovações em produtos, processos, organizacionais e de marketing apenas da indústria de transformação.
Entre os países com os melhores resultados em percentual de companhias que implantaram inovações em produtos estão: Filipinas (38%), Israel (34,2%) e Malásia (29,5%). As Filipinas (44%) também foram o país mais bem colocado em percentual de firmas que lançaram inovações em processo, seguido de Malásia (33,3%) e Brasil (32%). Na China, a proporção de empresas que implantaram inovações em produto ou processo foi similar, de 25,1% e 25,3%, respectivamente. Em três países foi registrado um maior percentual de empresas inovando em produto do que processo: Israel (34,2% e 30,9%), Rússia (8% e 5,9%) e África do Sul (16,8% e 13,1%).
O estudo concluiu que a inovação de produto ou processo está presente em todos os países, independentemente do grau de desenvolvimento econômico. "Isso ressalta a natureza difundida da inovação, especialmente em contraste com as atividades de P&D, que geralmente estão concentradas em países desenvolvidos", aponta o relatório do piloto.
(Guilherme Gorgulho, Inovação Unicamp)