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10/11/16

O que se perde no lixo falta à mesa

No Brasil, o quarto produtor mundial de comida, cerca de 3,4 milhões de indivíduos vivem em situação de insegurança alimentar, ou seja, não têm o que comer.

 

Apesar dos avanços tecnológicos e do aumento da área cultivada, que levaram a produção agrícola a níveis nunca antes alcançados, em torno de 800 milhões de pessoas no mundo – um a cada nove terráqueos – ainda passam fome. E um dos maiores responsáveis por essa situação, por incrível que pareça, é o desperdício de alimentos. Segundo dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO, na sigla em inglês), cerca de 30% de tudo que é produzido anualmente pelo campo vai para o lixo em algum momento de sua trajetória entre a lavoura e a casa do consumidor. No Brasil, o quarto produtor mundial de comida, cerca de 3,4 milhões de indivíduos vivem em situação de insegurança alimentar, eufemismo para dizer que na maior parte do tempo eles não têm o que comer. O número poderia ser menor se ao redor de 26,3 milhões de toneladas de produtos alimentícios não fossem jogadas fora todos os anos.

Esse total, amplamente divulgado, pode estar defasado ou ser inferior ao volume real descartado pelo país. “Não dispomos de metodologia para avaliar e quantificar as perdas e os desperdícios, não temos dados precisos e não é possível generalizar”, diz Murillo Freire Júnior, pesquisador em Tecnologia Pós-Colheita da Embrapa Agroindústria de Alimentos, uma unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, no Rio de Janeiro.

Seja como for, o fato é que, dependendo da fonte, o tamanho da montanha de alimentos perdidos pode ser ainda mais alta. De acordo com o pesquisador e professor José Abrantes, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), autor do livro Brasil, o País dos Desperdícios, somos um dos campeões mundiais em perdas de alimentos. “Descartamos cerca de 50% do total que produzimos”, diz. Isto equivale, segundo ele, a cerca de 2% do Produto Interno Bruto (PIB), o que correspondeu a algo perto de R$ 28 bilhões em 2015. “A nação que menos desperdiça é o Japão, com 20%, seguido da Europa e dos Estados Unidos, onde esse índice varia entre 25% e 30%”, informa.

O desproveito se caracteriza quando o alimento produzido é jogado fora, ou seja, não chega a quem necessita. A maior parte dos produtos é desprezada porque está fora do prazo de validade ou fora do padrão estabelecido pela legislação do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Um exemplo é dado pelos frutos considerados feios, que não são padronizados nem têm um apelo de venda comercial elevado, mas têm as proteínas, as vitaminas e os sais minerais de um produto normal.

No Brasil, as perdas ocorrem em todas as fases da cadeia produtiva, desde o plantio até chegar à mesa dos consumidores. Segundo Abrantes, já no plantio a perda é de 5%, porcentual que se repete durante o crescimento e amadurecimento da cultura. O manuseio inadequado e técnicas ultrapassadas durante a colheita levam outros 20%.

Saindo da lavoura, mais 20% de desperdício se dá durante o transporte. Os problemas começam quando a safra sai da porteira da fazenda, rumo a seu destino final, que pode ser um porto, de onde será exportada, ou os grandes centros urbanos consumidores no próprio país. Para isso, ela tem de cumprir uma longa jornada, que às vezes pode chegar até 2 mil quilômetros, enfrentando, na maior parte das vezes, estradas esburacadas, ferrovias escassas e lentas e portos sucateados. Não é de se surpreender, portanto, com a ocorrência de desperdício pelo caminho. Ao chegar a seus destinos intermediários, entre a lavoura e a mesa, isto é, nos locais de armazenamento e centros de abastecimento, outros 20% foram perdidos.

A nutricionista Flavia Queiroga Aranha, do Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), campus Botucatu, tem outros dados. “Apenas na Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), 100 toneladas diárias de comida vão para o lixo a despeito do fato de que de 30% a 50% ainda são próprias para o consumo”, informa. “Esse volume daria para alimentar mais de 30 milhões de pessoas durante um ano (o suficiente para acabar com a fome no Brasil)”. Para fechar os 100% de desperdício vale citar a perda de 5% no percurso entre o supermercado e as casas dos consumidores e 25% nas próprias residências. Segundo a Embrapa, cada brasileiro desperdiça 37 quilos de hortaliças por ano. Com base na informação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de que cada morador de uma grande cidade consome, em média, 35 quilos daqueles itens por ano, conclui-se que são jogados no lixo mais alimentos do que a quantidade consumida por uma pessoa.

As razões desse desperdício no Brasil são muitas e podem variar conforme o produto. Uma delas, segundo Flavia, é a falta de consciência da população sobre o problema. “Isso é uma característica da nossa cultura e que acaba afetando a economia nacional, apresentando resultado negativo para toda a sociedade”, argumenta. Há causas mais concretas, no entanto. Estudos da Embrapa apontam, no caso de frutas e hortaliças, o manuseio inadequado no campo, o uso de embalagens impróprias, o transporte deficiente, a comercialização de produtos a granel, a ausência de refrigeração, a contaminação, a ineficiência do comércio no atacado, o excesso de manuseio por parte dos consumidores, a forma como são dispostas nas gôndolas dos supermercados e a deficiência administrativa nos centros atacadistas e varejistas.

Diante desse quadro não causa espanto os números apresentados pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), segundo os quais cerca de 60% dos alimentos comprados pelos brasileiros não são aproveitados – o que representa dizer que mais da metade do lixo produzido no país, todos os anos, é composta por restos de comida. E isso porque muitos alimentos são indevidamente descartados, pois ainda estariam próprios para consumo. Para muitos estudiosos do problema, entre as causas do desperdício também se alinha a falta de planejamento na produção, na compra e no consumo. A isso, soma-se o inchaço da cadeia de comercialização, com a presença de muitos intermediários entre o produtor e o consumidor final. Algo semelhante ocorre nas feiras livres, instituições antigas que ainda se abastecem por meio de terceiros. Se comprassem direto dos produtores, seria mais fácil adquirir quantidades menores, adequadas às suas vendas e, consequentemente, reduzindo perdas.

O desperdício de alimentos, na realidade, é parte de um problema maior. O professor da UERJ, José Abrantes lembra que junto com a comida se desperdiçam água, energia, insumos e toda a cadeia de trabalhos envolvidos na produção, na colheita, no transporte e no armazenamento. “Ao não aproveitar devidamente os produtos alimentícios também estamos causando sérios problemas ambientais, pois para produzi-los precisamos de água, de energia e de insumos”, observa. “Tudo isto causa impactos, gerando prejuízos para o meio ambiente por retirar recursos da natureza que depois não aproveitamos”.

 

Comunicação CNTU
Matéria extraída da Revista E do Sesc

 

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